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O autor, que também colecionava cardápios e era apaixonado pela gastronomia, vivenciou uma intensa sociabilidade ao redor da mesa, com registros de encontros dos modernistas ler
Neste centenário da Semana de Arte Moderna de 1922, muito se falou sobre o Mário de Andrade poeta, romancista, ensaísta, musicólogo, folclorista, historiador de arte e crítico. Mas o que quase ninguém sabe é que o autor de Pauliceia Desvairada também foi um grande apreciador da culinária, especialmente a brasileira, e dos encontros em torno da mesa com os seus amigos modernistas. Apesar de não saber cozinhar, fazia críticas gastronômicas requintadas e dava instruções exatas de como gostava da comida. Foi também colecionador de cardápios, itens que estão preservados no Fundo Mário de Andrade, sob a salvaguarda do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP. É de lá, por exemplo, a dissertação de mestrado Modernistas à Mesa: a Coleção de Cardápios de Mário de Andrade (1915-1940), apresentada por Paula de Oliveira Feliciano.
Fruit Salad, Pauliceia Desvairada, Sandwich a Mestres do Passado, Gateau das Dúvidas, Quindins das Críticas, Chá Amargo e Refresco Debussy são os pratos do menu Mário de Andrade na Pauliceia, que apresenta desenho com assinatura de Anita Malfati e que abre a pesquisa de Paula. Encontrado pela pesquisadora na Coleção de Artes Visuais, também do IEB, o cardápio, embora não datado, foi produzido antes de 1922, ano da publicação de Pauliceia Desvairada, obra inaugural do Modernismo brasileiro, referida na ilustração. “No documento patenteiam-se testemunhos das tensões entre vanguardistas e ‘passadistas’”, afirma Paula, e explica: “O documento alude, por exemplo, aos ‘Mestres do Passado’, série de artigos de Mário de Andrade difundidos no Jornal do Comércio de São Paulo, entre agosto e setembro de 1921, focalizando a então festejada poesia parnasiana, para ressaltar suas fragilidades”.
A dissertação faz uma abordagem interdisciplinar dos cardápios colecionados, entre 1915 e 1940, pelo polígrafo modernista Mário de Andrade (1893-1945). Composta de 23 itens – entre menus de formato tradicional nos moldes franceses, cardápios estilizados e carta de bebidas, além de um marcador de lugar à mesa -, a coleção mostra que, mais do que uma lista ordenada de pratos de uma refeição ou plano de trabalho para cozinheiros, o menu se tornou, ao longo do tempo, um testemunho da vida cultural, social e política de uma época. O estudo, além de uma síntese da história dos menus, descreve e analisa a coleção de cardápios do poeta, recupera o interesse de Mário de Andrade por aspectos culturais e sociais da culinária e traz uma reflexão sobre os saberes gastronômicos observados na coleção e seus vínculos com a experiência culinária do tempo.
“A coleção de cardápios de Mário de Andrade foi-me apresentada em 2016, no processo seletivo (do programa de pós-graduação do IEB), pelo professor Marcos Antonio de Moraes”, conta Paula, que inicialmente tinha uma proposta mais ampla. Com formação em gastronomia e atuação como professora universitária na mesma área, Paula queria também focar o recorte no estudo da culinária brasileira, e a coleção permitiu efetivar o cruzamento da história do Modernismo, em particular a sociabilidade em torno da mesa, com a literatura culinária. Mas não foi tarefa fácil interpretar a coleção do criador de Macunaíma. “Foi preciso cruzar outros conhecimentos, como linguagem, tipografia, belas artes, história brasileira e universal, arquivo, a biografia de Mário, a de seus anfitriões e a dos comensais. Foi importante mobilizar outras esferas do saber para uma melhor compreensão desses documentos”, analisa Paula (ouça mais no podcast do IEB no spotify).
Prato do dia
Da sua coleção, presente no IEB, destaque para o segundo menu, datado de 9 de janeiro de 1921, que se refere ao lançamento de uma obra de Menotti Del Picchia, As Máscaras, detalhado pelo próprio autor no artigo O Almoço de Ontem no Trianon, no Correio Paulistano, como conta Paula. “Esse cardápio conserva características dos menus de princípios do século 20 quanto à estética, com a presença de adornos, vinhetas e desenhos, com requintes gráficos, diversidade de tipografias, marca do hotel anfitrião, além de nomear o homenageado. A inscrição do Mário de Andrade no cardápio pode sinalizar que os convidados recebiam uma cópia individual do menu”, explica. Paula ainda lembra da publicação de Cinco Crônicas de Mário de Andrade, de Telê Ancona Lopez – professora da USP e uma das principais pesquisadoras da obra de Mário de Andrade, coordenadora do Arquivo Mário de Andrade no IEB até 2008 –, em que Mário menciona e descreve a importância do Salão Trianon, na edição de março de 1921 da revista Ilustração Brasileira, e também cita o local no poema de abertura de Pauliceia Desvairada, Inspiração.
Outro destaque é o terceiro menu, de 19 de fevereiro de 1922, que se refere ao almoço realizado no mesmo período em que se dava a Semana de Arte Moderna, relacionando o desenvolvimento da hotelaria paulista como espaço das práticas de sociabilidade modernista. O documento traz assinaturas do próprio Mário de Andrade, Gomes Cardim, Agostino Cantù, Antonio Carlos Ribeiro de Andrada, dentre outros, e conserva características dos cardápios de modelo francês. Entre os pratos, destaca-se o Coração de Filé a Gomes Cardim, receita que, segundo Paula, não se encontra nas referências bibliográficas técnicas consultadas por se tratar, provavelmente, de prato em homenagem ao músico e político Pedro Augusto Gomes Cardim. “Essa prática de atribuir nomenclaturas de pessoas aos pratos é antiga e vem de uma época em que o repertório culinário estava sendo construído”, diz. E continua: “Esses usos também aparecem nesses documentos e mostram um dos aspectos marcantes da coleção de cardápios de Mário de Andrade, a experiência do lúdico que mostra o espírito vivaz e brincalhão do movimento modernista”.
Paixão desmesurada
Também fica clara sua paixão pelos ingredientes e receitas nacionais, no livro póstumo O Turista Aprendiz, publicado em 1977, resultado de suas viagens a Minas Gerais, Amazonas e Nordeste, como conta o jornalista José Antônio Dias Lopes no artigo As Empadinhas de Mário de Andrade (leia abaixo o texto na íntegra). “Documenta o apreço desmesurado do autor pelos ingredientes e receitas nacionais. Mais tupiniquim, impossível! Ele levava a sério e investigava a fundo tudo o que fosse nosso”, escreve Dias Lopes. Segundo o jornalista, “brasileiríssimos, os hábitos gastronômicos de Mário de Andrade ajudam a traçar o perfil de um dos heróis nacionais, cuja influência sobre todas as nossas atividades culturais permanece imensa”.
Dias Lopes ainda conta que Mário de Andrade amava as sobremesas: “Nunca faltou doce de batata-doce na casa da Rua Lopes Chaves n° 546, no bairro paulistano da Barra Funda, onde morava com a mãe, Maria Luísa, ou Mariquinha, e a tia Ana Francisca, ou Nhanhã. (…) Mas tinha que ser doce de batata rosada e não roxa ou branca. Também apreciava o de abóbora. Seus herdeiros conservaram um caderninho de capa dura com 34 páginas e 131 receitas de sobremesas”. Segundo o jornalista, as letras eram femininas, provavelmente da mãe e da tia, que se “notabilizavam como exímias doceiras” e “trabalhavam para fora, recebendo contínuos pedidos”.
O jornalista ainda relata que a casa de Mário de Andrade vivia em festa e quando havia almoço ou jantar para os convidados, eles passavam primeiro na cozinha para cumprimentar Tana, que trabalhou quase meio século com a família do poeta, até morrer na década de 1970. “Mário de Andrade adorava particularmente as empadinhas de Tana, fossem de palmito (receita reproduzida abaixo), frango ou camarão. Ela as fazia conforme antiga receita. Levavam manteiga, banha de porco e um pouco de água salgada”, revela. E dá outros exemplos: “Os pastéis de Tana eram sublimes. Ninguém preparava um bife na manteiga igual ao dela. A mesa precisava receber mais cadeiras quando o cardápio incluía bife”. Como diz Dias Lopes, o poeta e escritor admirava seu talento, embora não soubesse cozinhar. Mas sabia dar instruções precisas a Tana sobre como queria os pratos favoritos, e falava da comilança com requintes de crítico gastronômico. “Brasileiríssimos, os hábitos gastronômicos de Mário de Andrade ajudam a traçar o perfil de um dos heróis nacionais, cuja influência sobre todas as nossas atividades culturais permanece imensa”, finaliza.
Fonte: Jornal da USP